O medo e a ansiedade é algo que todos os dias está presente no consultório do médico dentista. Cerca de 70% da população apresenta ansiedade antes da consulta de medicina dentária e os pacientes cada vez mais temem e recusam os tratamentos dentários devido a esta reação emocional negativa causada pela visita e pelos procedimentos, tornando-se uma barreira significativa na procura dos mesmos.
Mas afinal, como surge este comportamento? Que consequências trás?
A ansiedade pode surgir tanto de experiências anteriores como através de experiências narradas por terceiros. Este comportamento de recusa e esquiva, é uma das principais causas de cancelamentos de consultas ou falta de interesse no tratamento, que leva por sua vez, ao agravamento de doenças orais, diminuição da autoestima, piorando assim a qualidade de vida.
Como forma de combate diversos tipos de terapias foram desenvolvidos, sendo a terapia assistida por animais, mais especificamente cães, uma delas.
Porque o cão como animal de terapia? Quais os locais de implementação e benefícios encontrados?
Estes tem desempenhado um papel significativo na evolução da humanidade, não tendo apenas um bom desempenho na leitura e interpretação de gestos humanos, como parecem facilitar comportamentos sociais e comunicativos dos seres humanos, promovendo sentimentos como confiança, lealdade e respeito.
Os cães são o animal de companhia mais comum, sendo assim, não surpreendentemente uma escolha popular nestas intervenções, agora introduzidas em diversos ambientes, como escolas, hospitais, clínicas, lares, creches e até prisões.
Trazem benefícios emocionais para pessoas de diferentes faixas etárias, classes sociais e condições de saúde. Assim, atualmente, este tipo de terapias, são estruturadas e orientadas para objetivos que incorporam animais na saúde, educação e serviço humano para fins de ganhos terapêuticos, melhoria da saúde e bem-estar. São aplicadas em várias condições médicas, como por exemplo crianças com transtorno do espectro do autismo, pacientes idosos afetados por demência ou até distúrbios psiquiátricos.
Objetivos e equipa multidisciplinar:
A terapia assistida por cães, apresenta um objetivo direcionado e individualizado, envolvendo rigor no que diz respeito ao planeamento, documentação, estruturação e orientação por metas, sendo dirigido pelos profissionais de saúde, no caso, pelo médico dentista. Envolve um animal com grande nível de treinamento, um treinador e muitas vezes o trabalho de uma equipa multidisciplinar, com veterinários, médicos, enfermeiros, psicólogos e fisioterapeutas. O animal pode pertencer ao médico dentista ou então ao treinador ou voluntário envolvido.
Requisitos necessários para a implementação em clínicas:
Atualmente, não existe legislação ou protocolos universais para esta prática. No entanto, destaca-se a necessidade de licenciar, credenciar e treinar os profissionais de saúde e/ou voluntários ou técnicos envolvidos na prática e de trabalhar num planeamento estratégico dos programas, para que se obtenham os melhores resultados.
O cão, deve ser:
- Saudável
- Sociável
- Com um comportamento positivo
- Treinado em obediência básica
- Limpo
- Bem tratado
- Com pelo menos 1 ano de idade.
O treino/comportamento e a saúde do animal são os dois pontos centrais na avaliação da seleção do cão.
O cão precisa de ser submetido a:
- Testes iniciais de temperamento
- Aulas de treino e obediência para comandos básicos
- Mais tarde, um treino adicional para garantir o comportamento apropriado na instituição, com tolerância dos equipamentos e ambiente hospitalar, evitando a adoção de comportamentos anormais ou aberrantes que possam causar danos no doente.
Certificação
O cão tem que possuir a habilidade para cumprir as políticas de segurança e de controlo de infeções das instituições envolvidas. Neste sentido, é realizada uma triagem, bem como testes e treinos, de forma a certificar a equipa, constituída pelo cão e pelo treinador.
Esta certificação é efetivada por uma associação creditada, como por exemplo, a ÂNIMAS. No final, as duplas são avaliadas pelas capacidades de empatia e relacionamento dos treinadores voluntários bem como pelo temperamento e a sociabilidade dos cães.
Benefícios da Terapia Assistida por cães:
Os cães de terapia tem demonstrado uma infinidade de efeitos positivos nos humanos.
Entre os efeitos documentados em humanos de diferentes idades, com e sem condições médicas ou de saúde mental especiais encontramos benefícios de: atenção, comportamento social, interações interpessoais e humor; parâmetros relacionados com o stress como cortisol, frequência cardíaca e pressão arterial; medo e ansiedade; saúde mental e física.
Vários trabalhos, em diversas áreas da saúde, referem que a presença do animal, demonstra uma diminuição na pressão arterial, nos níveis de cortisol, na frequência cardíaca e no sofrimento comportamental, sugerindo, não só uma redução do stress, como uma melhoria do humor.
E nas crianças?
Nas crianças, a presença de cães, parece ter um efeito calmante, contribuindo para lhes dar uma perceção positiva da situação, ajudando-as a lidar com experiências stressantes como a ida ao dentista. Estas acabam por ficar menos ansiosas e mais dispostas a colaborar com os adultos.
Vários estudos referem que a presença do cão de terapia trás um maior conforto ao paciente, uma visita que era aterrorizante deixa de o ser, os pacientes em vez de agitados passaram a entrar felizes e a sorrir no consultório e deixar os acompanhantes na sala de espera, deixa de ser uma fonte de ansiedade uma vez que passam a ser acompanhados pelo animal.
E os riscos? Existem?
Sim, apesar de todos os benefícios relatados, é necessário identificar sistematicamente todos os potenciais riscos associados à implementação da terapia assistida por cães numa clínica dentária.
As decisões de aceitar estes animais no ambiente de trabalho devem ter em consideração a saúde, segurança e bem-estar de todos os envolvidos, bem como estimar a probabilidade de eventos adversos e orientar na minimização e controlo destes riscos.
Concluindo, a terapia assistida por cães no controlo da ansiedade dentária surge como uma abordagem simples, económica e pouco invasiva, com efeitos benéficos como a redução do ritmo cardíaco e da pressão arterial. Para tal, mostra-se necessário a implementação de várias regras, de forma a garantir a saúde, segurança, desinfeção e bem-estar do paciente, do cão terapeuta e de toda a equipa envolvida.
Gostou deste artigo? Ficou esclarecida? Confiava na presença de um cão no consultório? E não se importaria?
Artigo escrito pela médica dentista,
Mariana Mauril