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Neste espaço partilho a minha experiência e conhecimento. Aqui surgem as respostas a muitas dúvidas de pais ou profissionais na área da medicina dentária.

Alterações dentárias na alimentação vegetariana e vegana

A dieta vegetariana e vegana tem cada vez mais adeptos. Nos dias que correm a preocupação do indivíduo com a sua saúde e bem-estar é cada vez maior. A saúde oral depende da interação complexa de fatores intrínsecos e extrínsecos ao indivíduo. A dieta é um dos fatores que contribui de forma fundamental para a saúde oral, pois uma alimentação equilibrada é crucial para saúde das gengivas, dos dentes e dos maxilares. Assim, há várias questões que surgem frequentemente associadas aos efeitos da dieta vegetariana ou vegana na saúde oral.


A saliva altera em função da dieta?

Sabemos á luz da informação existente que não há uma alteração per si da flora salivar, ainda assim, é possível através de exames laboratoriais distinguir o tipo de dieta que o indivíduo segue, pois há na saliva marcadores biológicos, resultantes da digestão alimentar, que nos permitem identificar se, por exemplo, o indivíduo segue uma dieta vegetariana/vegana ou omnívora.

Estes biomarcadores podem ter efeitos mais benéficos ou mais prejudiciais e o que se observa é que os marcadores das dietas omnívoras são mais benéficos por darem origem a uma saliva e placa bacteriana mais alcalina quando comparada com a saliva dos vegetarianos e veganos. Isto porque, os marcadores biológicos presentes na saliva destes originam, por norma, uma saliva mais ácida que é mais prejudicial para a proteção da estrutura dentária. No entanto, a vantagem para os vegetarianos e veganos é que ao contrário dos indivíduos omnívoros estes não aumentam ainda mais acidez da saliva com a idade.


Os vegetarianos e veganos têm mais cáries?

Observou-se que nos vegetarianos e veganos havia uma maior tendência para o aparecimento de cáries e erosão dentária, pensa-se que isto seja devido à saliva mais ácida, à redução de consumo de flúor, ao alto consumo de frutas (que quando consumidas em grandes quantidades produzem muitos açucares que atuam de forma semelhante à sacarose presente nos doces), a um baixo consumo de cálcio e a um alto consumo de frutos cítricos e vinagres que se comportam como agentes erosivos. Desta forma, para colmatar estes efeitos recomenda-se a ingestão abundante de água para reduzir a acidez salivar bem como aplicações tópicas de flúor periódicas e a utilização de pastas com flúor de origem não animal.


Há maior inflamação gengival nos vegetarianos e veganos?

Este é um tema controverso pois alguns estudos clínicos recentes revelaram uma menor inflamação das gengivas, assim como menor sangramento em relação aos indivíduos omnívoros não havendo, ainda assim, diferença significativa nos valores de recuo gengival. Este estudo aponta para que os principais motivos destes resultados se devem ao facto de que, por um lado, os vegetarianos não consumirem produtos de origem animal e terem, normalmente, estilos de vida mais saudáveis, por outro, consumirem mais alimentos antioxidantes (importantes para a redução de inflamação da gengiva), e destes indivíduos não serem, na maioria das vezes, fumadores ou consumidores de álcool (dois fatores altamente predisponentes para a inflamação ou alteração da gengiva).

Neste estudo observou-se também um menor índice de placa bacteriana (fator primário para a inflamação da gengiva) o que por sua vez, revela maior nível higiene e, possivelmente, maior frequência de visitas ao médico dentista do que os indivíduos não vegetarianos.

No entanto, existem outros estudos que mostram que, contrariamente ao descrito anteriormente, há um alto risco de os indivíduos vegetarianos estarem mais sujeitos à inflamação gengival, dada a associação significativa entre a baixo consumo de vitamina D e a presença inflamação. Observaram que a vitamina D tem um efeito anti-inflamatório e imunomodelador importante.  Contudo, não há informação suficiente para determinar conclusivamente a associação entre os níveis de vitamina D e a inflamação gengival, sendo necessário investigar mais sobre este assunto.


Quais as carências nutricionais dos vegetarianos e vegans mais prejudiciais na saúde oral?

Sem dúvida a mais preocupante é a deficiência de vitamina B12 pois, a longo prazo, pode ter efeitos catastróficos no organismo e há alguns sintomas que podem surgir na boca como lesões na língua ou no interior das bochechas, feridas nos cantos dos lábios, perda de sensibilidade em certas zonas da boca, o inchaço da língua, falta de paladar ou ainda uma sensação de ardor na boca. Para contornar estes efeitos recomenda-se a toma de suplementos, a ingestão periódica de carne ou ainda a utilização de pastas reforçadas com vitamina B12.

Por outro lado, pensa-se que uma alimentação rica em vitamina C e fibra como a dieta vegetariana e vegan possa reduzir a probabilidade de aparecerem cancros orais ou do trato respiratório. Ainda não se sabe bem o mecanismo de funcionamento, mas pensa-se que a vitamina C possa bloquear a produção de nitritos e a impedir a formação de nitrosamina que é um conhecido carcinogéneo, havendo já alguns estudos que apoiam esta hipótese.


Será uma dieta vegetariana ou vegan saudável para o desenvolvimento dentário nas crianças?

Ainda não há muita investigação nesta área, mas o que sabemos é que numa alimentação com baixo teor de cálcio e vitamina D, como muitas vezes são as dietas vegetarianas e vegans, pode levar ao aparecimentos de alguns problemas na calcificação da estrutura dentaria, como por exemplo, uma amelogénese assintomática ou uma dentinogése imperfeita, condições difíceis de tratar e que têm de ser constantemente acompanhadas pelo médico dentista. Adicionalmente as crianças que sigam este regime podem manifestar mais cedo os sintomas da falta de vitamina B12.


O consumo elevado de chá verde tem benefícios na saúde oral?

O chá verde muito consumido pelos vegetarianos e vegans no dia a dia, parece ser altamente benéfico, uma vez que é uma fonte de antioxidantes e ainda numerosas vitaminas, proteínas e minerais importantes para a manutenção da saúde oral. Por exemplo, sabemos que ajuda na eliminação do mau hálito ao bloquear a atividade de certas bactérias responsáveis pela produção de compostos causadores do cheiro desagradável.

É bom também para ajudar a diminuir o número de caries uma vez que, inibe a atividade das bactérias responsáveis pelas cáries e promove a reparação da estrutura dentária através do flúor presente nas folhas de chá verde. Por fim é também importante para manter a saúde das gengivas pois os antioxidantes presentes no chá verde protegem as mesmas ao impedirem a colonização e desenvolvimento de certos microorganismos que aderem à gengiva e que libertam compostos tóxicos que a destroem e protege também do efeito inflamatório do fumo do tabaco.


Qual a influência dos produtos veganos na higiene oral?

Para tentar diminuir um pouco a erosão dentária existem colutórios produzidos a partir de óleos vegetais como o óleo de girassol, azeite, óleo de palma, óleo de coco e óleo de cártamo, sendo que foi observado que o mais eficaz é o colutório produzido com óleo de palma quando comparado com outros colutórios mais comuns que existem no mercado. Existem ainda colutórios de extrato de folha de bambu ou soluções de clorofilina com sódio e cobre que são eficazes no combate ao mau hálito e que têm atividade antimicrobiana nas bactérias, usualmente, presentes na flora oral.

Uma das novidades que surgiram no mercado das pastas veganas é as pastas reforçadas com vitamina B12 tendo sido notado o efeito positivo das mesmas no reforço da concentração de vitamina B12 no organismo. Ainda dentro das pastas existem várias que são consideradas veganas, mas o importante é escolher as que contêm flúor de origem natural, como por exemplo, de óleo de coco, ou de glicerinas produzidas à base de milho ou ainda à base de soja.

Há também várias opções mais ecológicas e vegan-friendly do que as escovas normais de plástico. Existem agora escovas de plástico 100% reciclado, escovas de cana de açúcar e óleo de mamoa e as escovas de bambu, que apesar de ser referido como um antibacteriano natural, tem uma elevada capacidade de absorção de humidade. A maior parte destas escovas designadas alternativas utilizam cerdas de nylon, uma vez que, as cerdas naturais parecem ser demasiado duras e abrasivas. No entanto, há alguma preocupação com as cerdas de nylon, em muitas marcas as cerdas são de nylon-6, que não é biodegradável podendo ser um motivo de desagrado em indivíduos veganos.

Além de escovas existem também em algumas marcas escovilhões, palitos e fios dentários de plástico 100% reciclado.


7 cuidados de saúde oral para os vegetarianos ou veganos:

  • Consumo de alimentos com maior teor de cálcio e vitamina D;
  • Toma de suplementos alimentares (sempre com o acompanhamento do seu médico assistente ou de um nutricionista);
  • Consumo, nem que seja periódico, de carne de forma a tentar restabelecer os níveis de vitamina B12;
  • Redução de consumo de frutos cítricos de forma a tentar diminuir a erosão dentária;
  • Evitar a escovagem logo após o consumo de frutos ou sumos cítricos uma vez que há estudos que mostram que pode aumentar a erosão cerca 37x;
  • Realizar aplicações tópicas de flúor periódicas de forma a fortalecer a estrutura dentária e prevenir o aparecimento de cáries dentárias;
  • Utilizar de pastas com flúor para ter níveis mais próximos do ideal de flúor.

Espero que este pequeno texto tenha sido esclarecedor pois apenas pretende informar o leitor e têm por base a leitura e interpretação de vários artigos científicos existentes até ao momento.


Autora: Madalena Almeida Silva 

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